ENTREVISTA 31 O que mudou no setor alimentar nos últimos dois anos? Tal como aconteceu na história em vários momentos, mudou a perceção dos vários atores quanto à maior probabilidade de ocorrer o improvável. Fruto da situação pandémica há alterações de comportamento por todos. Desde logo, nos diferentes impulsos de compra e venda, quanto ao tempo e espaço onde os mesmos ocorrem. A Covid-19 teve consequências muito intrusivas na nossa vivência diária. Seja dos cidadãos, empresários, agentes da administração, academia e investigação. Foi marcadamente disruptivo ao nível das cadeias de abastecimento, provocando enormes desafios logísticos e agravando os custos de contexto e das matérias-primas. Como tudo na vida, assinalemos os aspetos positivos. Veio à tona uma solidariedade que congregou o espírito humanista e personalista e confluíram sinergias para a implementação de soluções inovadoras na resposta a problemas concretos. Veja-se o salto de gigante na transição digital, alavancando a nossa auto-capacitação neste domínio e a performance exportadora da nossa agroindústria, como revelam os dados do INE. Os nossos desafios societais em matéria de segurança alimentar, agricultura e alterações climáticas são mais urgentes do que nunca. Olhando para o futuro, é evidente que alimentar o mundo exigirá uma grande transformação na forma como nós iremos produzir, gerir e consumir alimentos de modo a alcançar sistemas de produção agropecuários resilientes e sustentáveis. Estes têm, concomitantemente, que ajudar a mitigar as emissões de GEE e adaptar-se à evolução das condições ambientais, além de garantirem a segurança alimentar e nutricional. Urge repensar o sistema alimentar europeu no contexto global, o que, e como, produzimos, e comercializamos alimentos, reduzimos o desperdício e perdas. Importa uma abordagem que salvaguarde a biodiversidade e os ecossistemas, face aos múltiplos desafios: carbono neutro sustentável e sistemas de produção resilientes, preservando os solos, a biodisponibilidade da água e demais recursos da biodiversidade, ao mesmo tempo que produz alimentos de alta qualidade. Por fim, mudou a consciencialização coletiva quanto às causas que impactam no sistema, com as crises que podem advir, como com a Covid-19 e com as alterações climáticas que exigem uma redução do risco e respostas proativas em contexto científico, societal e político. A pandemia obrigou a alterações na rotulagem dos alimentos? O que diz a legislação portuguesa e de que forma se adequa às diretivas europeias? Quanto à rotulagem não houve nenhuma alteração significativa, pois já estava assegurada a proteção dos interesses dos consumidores, através do Regulamento (EU) 1169/2011. Temos o reflexo do empoderamento dos consumidores que seguem dietas mais saudáveis, equilibradas e sustentáveis. Daí que, pese embora coexistam vários esquemas de rotulagem nutricional na UE, a CE tem estado a trabalhar na harmonização que incentive a indústria a oferecer produtos alimentares saudáveis e sustentáveis (Front of Pack Nutrition Labelling). Sabemos que é uma consensualização difícil entre tantos interesses em jogo em diferentes geografias. A posição nacional, quanto a esta matéria, vai no sentido de acautelar a perceção de segurança e qualidade dos alimentos, através de um sistema de rotulagem nutricional único harmonizado e que não induza em erro quanto ao valor nutricional ou impacto na saúde. Mais, acautela a defesa de géneros alimentícios, que nos são relevantes como o azeite, e os consagrados DOP’s/IGP’s e ETG’s (Denominações de Origem Protegida, Indicações Geográficas Protegidas e Especialidades Tradicionais Garantidas). Há uma maior consciência por parte da indústria e dos consumidores para a informação a constar nos rótulos? É inegável que sim. O caminho trilhado entre as várias partes interessadas tem sido muito positivo. Indústria e consumidores têm níveis de literacia e de exigência cada vez maiores. A perceção é clara que as relações entre os vários elos da cadeia são estabelecidas e fundadas em "Pese embora coexistam vários esquemas de rotulagem nutricional na UE, a CE tem estado a trabalhar na harmonização que incentive a indústria a oferecer produtos alimentares saudáveis e sustentáveis (Front of Pack Nutrition Labelling)"
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