GRANDE ENTREVISTA 25 que as empresas portuguesas que exportam estão preparadas para isso. Obviamente que não é bom aumentar tarifas, mas a verdade é que se há uma desvalorização do dólar a 10% ninguém diz nada, e quando há um aumento de uma tarifa a 10%, já ‘acaba o mundo’. Temos de ser competitivos no mercado americano, e somos. Agora, se houver uma tarifa diferenciada para a União Europeia, mais cara, isso já é diferente. É impossível fazer uma previsão em termos das culturas mais afetadas. Com a guerra na Ucrânia, na prática, houve uma especulação nos cereais - os preços subiram, a especulação acabou, voltaram a cair. Num setor muito modernizado que aposta de forma crescente na utilização de drones, precisão digital e modelos preditivos na sua produção, que oportunidades irrompem para os agricultores portugueses? Assistimos a uma evolução brutal na forma de fazer agricultura. Até nas atividades mais tradicionais, como o pastoreio, em que se pode pensar que não há nada para inventar. Mas há. Temos uma grande revolução em curso. Vamos realizar na FNA uma conferência sobre agricultura regenerativa e é impressionante acompanhar o conhecimento que leva ao inverso da atuação que tem sido feita até aqui, já com resultados práticos. Começa-se a falar em todo o tipo de técnicas ou tecnologia que permitam poupar dinheiro e manter a produção ou aumentá-la. Existem culturas onde se demora algum tempo a fazer a transição, outras onde se demora menos tempo, mas o caminho é esse. O caminho é também o de ouvir a ciência e tomarmos decisões com mais base científica e com menos base ideológica. Acredito que se os governos agissem assim, e se em Portugal houvesse uma estratégia de desenvolvimento para o setor agrícola, a agricultura poderia contribuir muito mais para a riqueza do país do que aquilo que contribui, porque não tem sido minimamente enquadrada. Precisamos que os meios que existem sejam aplicados com coerência e não é isso que tem acontecido. Desperdiçámos totalmente a oportunidade de reforçar a resiliência do setor agrícola através do PRR [Plano de Recuperação e Resiliência], que em Portugal apenas serviu para engordar o Estado, já que perdemos grande parte do dinheiro porque os prazos não foram cumpridos ou porque as obras não foram feitas, tal como a CAP alertou desde o princípio. Escolheu-se o caminho mais fácil, e quando o caminho é fácil o resultado é mau. Ainda assim, mantém a esperança na agricultura nacional? Esperança mantenho sempre, mas são oportunidades perdidas, e se tivessem sido aproveitadas, se tivéssemos feito como fizeram os espanhóis, que utilizaram 25 mil milhões de euros no investimento em água, dos quais cinco mil milhões só para o setor agrícola, os agricultores portugueses em todo país teriam uma resiliência face à seca e uma capacidade que não têm. E sabemos que se este ano choveu, também pode acontecer que não chova nos próximos. n *Esta entrevista foi realizada a 9 de junho de 2025, na Feira Nacional da Agricultura, no CNEMA, em Santarém. Temos uma grande revolução em curso, centrada em todo o tipo de tecnologia que permita poupar dinheiro, e manter a produção ou aumentá-la
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